segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Nihil sub sole novum

Falar da decadência da educação, hoje em dia, é como chutar cachorro morto. Sabemos muito bem o que está errado, e o que deve ser feito. Fala-se em despreparo dos professores, muitos deles desatualizados, que não possuem uma formação contínua. Fala-se em salários baixos, estruturas escolares precárias. Reclama-se da falta de participação dos pais na vida escolar dos filhos e do descaso do governo. Enfim, sabemos que tudo isso, misturado, resulta no grande problema da educação brasileira.
Essas questões, todas consideradas de grande importância, geralmente ofuscam uma outra que é tão relevante quanto aos outras para a construção de um sistema escolar eficiente: os conteúdos lecionados.
Em 1976, o geógrafo francês Yves Lacoste publicou uma obra intitulada "A Geografia - Isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra". E claro, seu título gerou muita polêmica. O que Lacoste queria com isso, era demonstrar sua preocupação com a utilidade da disciplina Geografia nas escolas e universidades. Lacoste sabia que a Geografia vinha se tornando uma disciplina morta, como o Latim, que serviria exclusivamente para uma descrição (mantida pela famosa decoreba) do espaço geográfico: relevos, nomes de bacias, formações rochosas,países e suas capitais. Passados mais de 30 anos, notamos avanços na disciplina Geografia. Está cada vez mais incorporando os aspectos da Sociologia, História, Economia e outras áreas de estuda, para avaliar, além da descrição do espaço, a forma como o homem vem se organizando nesse espaço, ou melhor, no planeta.
Porém, as grades curriculares de muitas escolas continuam a exigir conteúdos absurdos aos alunos. Conteúdos que de nada servem, a não ser prepará-los para passar no vestibular. Recentemente, o governo federal alterou a proposta do Enem, com o objetivo de substituir o famigerado vestibular. Essa nova proposta é um avanço, mas está longe de acontecer. Enquanto isso, nossos alunos são massacrados com uma avalanche de inutilidades.
Qual a utilidade em saber a nomenclatura dos hidrocarbonetos? Os nomes dos elementos pertencentes à família dos gases nobres? A utlidade em saber em que data os holandes invadiram Pernambuco? O conceito de sintagma? Matrizes e Determinantes?
A grade é ruim. Matérias são jogadas ao vento. Os alunos se perguntam "para que isso?" e ninguém os responde. O conteúdo deve fazer sentido para o aluno. Ele não é uma tábula rasa. Sabe o que quer aprender. Quer conteúdos interessantes, que estejam ligados entre si, que estejam ligados à sua vida e à sua sociedade.
De quem é a culpa por tudo isso? Os professores e a direção, desatualizados todos? Antes de botar a culpa somente neles, é preciso lembrar que professores e diretores são guiados pelas currículos elaborados pelo governo. A mudança de atitude deve começar pelos Programas Nacionais Curriculares. Além de modernizar suas concepções, o governo deve garantir a aplicação de tais concepções, daí a importância da valorização dos projetos de formação continuada. Não só nas escolas primárias e secundárias: deve também reoorganizar o sistema universitário, pois ele é quem faz a manutenção desse sistema, lançando, todos os anos, mais professores no mercado.
O vestibular precisa mudar seu formato urgentemente. Mas ele não é o protagonista desssa história. É só um, dos muitos sinais de que o sistema de educação brasileiro é arcaico. Que isso mude logo. Ninguém aguenta mais chutar, digo, aprender conteúdos mortos. Enterremos de vez esse sistema em putrefação.
Eduardo Silveira

5 comentários:

Robson dos Passos disse...

Realmente a geografia tradicional passou por grandes transformações e hoje já é chamada de geografia critica ou radical. O sistema de ensino está nublado com perguntas que inquietam nossos jovens. O vestibular deveria realmente atribuir outro método de avaliação visando o conhecimento e não a decoreba!
Um ótimo texto,mas coloca o autor :~
66'

Eduardo Silveira disse...

Pois é, espero sinceramente que o atual modelo de vestibular caia.
E que caia logo! Vou ser professor, e não quero me ver obrigado a ensinar inutiliades para meus alunos.


ooo, Róbson
mas é que o nome tá lá embaixo

"Postado por Eduardo Silveira",
o pórpio. =D

Abraço, e obrigado pelo comment.

ítalo puccini disse...

é, cara, quando dizem que o buraco é mais embaixo, discordo. o buraco já é sem fim faz tempo, não é mais embaixo nem mais em cima.

tô contigo, sobre a questão dos conteúdos e do vestibular. é um troço difícil demais de mudar, esse sistema todo. mas aos poucos, beeem aos pouquinhos, mudanças surgem. mas até a coisa pegar no tranco mesmo, só pra próxima geração...

e tem outro detalhe: por mais que façamos aulas interessantes, com conteúdos interessantes e etc, são poucos os alunos que se interessam pelo que passamos. sinto isso diariamente. isso porque a educação que eles recebem em casa é a da inutilidade, do vazio, daquilo que pra nada serve.

por isso que o buraco já não tem fim.

Eduardo Silveira disse...

Olá Italo,
obrigado por sua contribuição.

Putz, cara. Vc vê isso de perto, né.
E Por saber da sua capacidade para dar aulas criativas, dói-me ler essa parte:

"por mais que façamos aulas interessantes, com conteúdos interessantes e etc, são poucos os alunos que se interessam pelo que passamos. sinto isso diariamente."

Mas é a verdade, né. :P

Mais uma vez, obrigado.
Abraço!

Robson dos Passos disse...

A profissão exige demais, tem que gostar muito do que faz :~
Espero poder conquistar os alunos daqui a alguns anos.
Abraços e boa semana!